terça-feira, 7 de agosto de 2012

"Tristes Trópicos": mais do que um livro, uma mudança de conceito

Por Clayton Ribeiro

Em 1955, o livro "Tristes Trópicos", do antropólogo Claude Lévi-Strauss (1909-2009), foi publicado; começava uma nova forma de abordar a sociedade indígena. Lévi-Strauss fez parte de uma comitiva de professores franceses que vieram ao Brasil na década de 1930 para fundar cursos do campo das Ciências Humanas na Universidade de São Paulo - USP.


Capa da edição brasileira dos "Tristes Trópicos", imagem: www.extra.com.br/

Durante seus períodos de férias da USP, Lévi-Strauss visitava comunidades indígenas no Brasil Central e na Amazônia, tais como os Bororo e os Nambiquaras; aliás, esse foi um dos motivos do interesse desse antropólogo em vir para o Brasil. Depois de quatro anos fazendo anotações, em forma de diário, Lévi-Strauss construiu uma narrativa - ainda que de leitura enfadonha em muitos momentos - que entrou para o limitado grupo dos livros canônicos da antropologia mundial, assim como da história do Brasil.

O livro "Tristes Trópicos" tem muitos méritos, aqui falarei de um apenas: a desmistificação do mito do "bom selvagem". Era senso comum entre os pesquisadores tratarem o índio como um ser quase imaculado, inocente, sem maldade. Assim, o índio viveria em perfeita harmonia com o sistema ecológico, entre outras coisas. E a colonização européia desumana, quanto sofrimento!


Claude Lévi-Strauss no Brasil na década de 1930, imagem: www.dusinfernus.wordpress.com/

A despeito disso, Lévi-Stauss analisou a sociedade indígena sem esses preconceitos, mostrando suas fraquezas morais, contradições, hipocrisias, comuns a qualquer comunidade humana. Muitos dos comportamentos hipócritas dos indígenas observados pelo antropólogo decorria de sua organização patriarcal. Ora, esse tipo de cultura patriarcal, machista, Lévi-Strauss também encontrou em suas viagens pelo mundo árabe. Entre os árabes é comum o homem ter várias mulheres, desde que ele as mantenha financeiramente de modo satisfatório. Porém, esse comportamento não era fruto de uma cultura religiosa tradicional ou de relações sociais harmônicas, mas de um patriarcalismo autoritário. Desse modo, a comparação entre os hábitos indígenas brasileiros com os dos árabes, feita por Lévi-Strauss, nos trouxe uma lição que ainda hoje não foi completamente compreendida por vários pesquisadores da cultura indígena.

Quem conhece o livro "Tristes Trópicos"? Foi assim que um antigo professor, dos tempos das aulas na Faculdade de Educação (FAE) da UFMG, nos inqueriu certa vez. Para sua surpresa, ninguém da sala tinha ouvido falar dos "Tristes Trópicos". Então, o professor comentou algo como: "quem não leu esse livro, não conhece a história do Brasil". Hoje, se eu pudesse acrescentar algo a essa frase, diria: quem não leu esse livro, não conhece a história universal em sua essência.

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